terça-feira, 30 de novembro de 2010

A Banalização do Sagrado

Por Pastor Sérgio Pereira

Para inicio de conversa é preciso definir o termo banalização. Banalização é algo que teve sua imagem desgastada, ou algo de importância que se tornou menos importante pela exaustão da repetição sobre um determinado assunto. "A banalização da violência", por exemplo, pode expressar que, de tão comum, algo tão sério acabou virando algo rotineiro. Banalização (banalizar + ção) é o substantivo construído a partir do verbo banalizar (banal + i + zar), que indica a ação de tornar banal (comum, curriqueiro, costumeiro, aceitável facilmente, incorporável...), com origem na forma francesa arcaica "ban-". Banalização significa ainda vulgarização. Banalizar é tornar algo “estupidamente” comum e sem importância, vulgarizar. Fazer com que algo perca a importância é uma das estratégias mais eficazes para destruir, em definitivo, o poder de um fato, uma idéia.

Numa olhada rápida e sem profunda análise para o meio evangélico atual, não é necessário ser expert para definirmos que ocorre em muitos setores uma irritante banalização do sagrado.

A liturgia outrora tão simples, hoje rodeada de pompa, bons cantores e oradores, mas tão banalizada, tão vulgarizada. O lugar do culto que deveria ser o epicentro da adoração e da manifestação do divino, o encontro do sagrado com o humano, é vulgarizado por crentes inescrupulosos que não possuem a nítida compreensão dos elementos do verdadeiro culto a Deus. Junta-se a isso ministros do altar, que fazem do púlpito a profissionalização de suas ambições, mercantilizando o evangelho genuíno de Jesus.

A esses produtores da banalização do ambiente sagrado, o apostolo Pedro em sua segunda carta afirma que eles foram resgatados pelo Senhor, mas se desviaram (2.1,15,19,20-22), apesar disto, continuam dentro da Igreja (2.1,13). O interesse deles é puramente financeiro, tal como Balaão (2.3,14-15) e que muitos os estão seguindo (2.2). todavia, seu modo de caminhar é identificado através de seu comportamento. Pedro apresenta verbos e adjetivos que nos fazem compreender o caráter dos banalizadores do sagrado: falsos, dissimulados, hereges, destruidores, negam a Cristo, libertinos, avarentos, mentirosos, fazem comércio de vidas, são carnais, seguem paixões imundas, são rebeldes, atrevidos, obstinados, como animais irracionais, blasfemos, injustos, luxuriosos, enganadores, adúlteros, insaciáveis, malditos, vaidosos, arrogantes, inconstantes, escravos da corrupção (2.1-3,10-14,18-19; 3.3). Apesar de todo esse conteúdo maligno, tais homens apresentam uma aparência positiva. Afinal, são líderes, são mestres, e prometem liberdade aos seus seguidores (2.1-2,19). Mas, no final, “são fontes… sem água. São nuvens… também sem água” (II Pe 2.17; Jd 12). O seu aspecto é promissor, mas eles não produziam nada de positivo. Para um povo que vivia em região seca, árida, onde as chuvas eram extremamente necessárias, nuvens sem águas eram inúteis, um triste engodo. É triste saber disto, mas há cristãos inúteis. Não beneficiam ninguém. São enganadores.

Cito as palavras de Isaltino Gomes Coelho Filho em artigo de título igual a este: “Observo a trivialização da oração e da leitura bíblica, por exemplo. Vai se iniciar uma assembléia administrativa, seja em igreja ou em assembléia convencional. É de bom tom fazer um momento devocional. Gostaria muito de pensar que nossos corações estão ali, na devoção. Sucede que, muitas vezes, é um ato rotineiro, uma obrigação a cumprir, e enquanto é cumprida, todos parecem ansiosos para que termine e se vá ao principal, a administração dos negócios de Deus. A comunhão com Deus deve cessar logo para cuidarmos dos negócios dele. Vejo, nas assembléias convencionais, pessoas conversando, usando celulares, lendo relatórios, cumprimentando-se, conversando alegremente, enquanto o momento espiritual transcorre. A parte séria, que importa e que levou as pessoas até ali, ainda não começou. O que está se fazendo é só uma “devocionalzinha”.”

Milhares de pessoas entram pelos umbrais da igreja evangélica, mas continuam prisioneiras de seus pecados. Têm nome de crente, mas não vida de santidade. Em vez de ser instruídas na verdade, são alimentadas por toda sorte de misticismo contrário às Escrituras. Em vez crescerem no conhecimento e na graça de Cristo, aprofundam-se no antropocentrismo idolátrico, que está maquiado de espiritualidade. Dentro desta perspectiva, os céus estão a serviço da terra. Deus está a serviço do homem. Não é mais a vontade de Deus que deve ser feita na terra, mas a vontade do homem no céu. Tudo tem de girar ao redor das escolhas, gostos e preferências do homem. O bem-estar do homem e não a glória de Deus tornou-se o foco central da vida. Assim, o culto também tornou-se antropocêntrico. Cantamos para o nosso próprio deleite. Louvamo-nos a nós mesmos. Influenciados pela síndrome de Babel, celebramos o nosso próprio nome.

A banalização do sagrado é denunciada nas Escrituras. O profeta Malaquias denunciou com palavras candentes o desrespeito dos sacerdotes em relação à santidade do nome de Deus, do culto, do casamento e dos dízimos. A religiosidade do povo era divorciada da Palavra de Deus. As coisas aconteciam, o povo vinha ao templo, o culto era celebrado, mas Deus era não honrado. Jesus condenou, também, a banalização do sagrado quando expulsou os vendilhões do templo. Eles queriam fazer do templo, um covil de salteadores; do púlpito, um balcão de negócios; do evangelho, um produto de mercado e dos adoradores, consumidores de seus produtos. O povo profanava com suas atitudes, estavam preocupados consigo mesmos, fizeram do templo um lugar para ganharem a vida. Por causa de seus interesses vinham ao templo não para terem comunhão, nem tampouco para oferecerem sacrifícios. O templo era tudo para eles, menos lugar de adoração, de devoção. O templo deixou de ser um lugar atrativo para o mundo, pois o pátio reservado aos gentios que não conheciam a Deus, estava contaminado pelos vendilhões.

Nos dias de Eli o povo de Israel entrou em guerra contra os filisteus, pensando que Deus estava do lado deles, mesmo quando seus sacerdotes estavam em pecado. Porém, vários israelitas morreram na batalha, porque o ativismo não substitui santidade. Em vez de se arrependerem mandaram buscar a arca da aliança, símbolo da presença de Deus. Quando a arca chegou, houve grande celebração ao ponto de fazer estremecer o arraial do inimigo, mas uma derrota ainda mais fatídica foi imposta a Israel e trinta mil soldados pereceram, os sacerdotes morreram e a arca foi tomada pelos filisteus.

Alegria e entusiasmo sem verdade e sem santidade não nos livram dos desastres. Rituais pomposos sem vida de obediência não agradam a Deus. Deus está mais interessado em quem nós somos do que no que fazemos. Antes de Deus aceitar o nosso culto, ele precisa agradar-se da nossa vida.

Precisamos examinar os nossos corações e nos voltarmos para Deus. Arrependamos-nos! Deixamos o pecado e revistamos-nos da verdade do Evangelho para que a luz de nossas obras brilhe diante dos homens a fim de glorificarem o nosso Pai que está nos céus (Mt 5.16).